"Quantos morreram para que chegássemos aqui?", questiona Petro em discurso de vitória

Unidade, esperança, reconciliação e reconstrução: essas foram as chaves do discurso de vitória de Gustavo Petro e Francia Márquez; veja os melhores momentos

Nada define tão bem as eleições colombianas como o desejo de mudança. A demanda, que se tornou imperativo popular, tem em seus primórdios o chamado estallido social [levante popular] vivido no país em 2019 – 2021. O candidato de extrema-direita Rodoldo Hernández tentou se camuflar, mas ao final, os colombianos optaram pela fórmula que rompe com o poder estabelecido no país.

Em seu discurso de vitória, neste domingo (19), Gustavo Petro, da coalizão progressista Pacto Histórico, afirmou que a mudança consiste em deixar o ódio e o sectarismo para trás: “as eleições mostraram duas Colômbias e queremos que esta seja uma Colômbia”.

Para Gustavo Petro, colombianos devem se enxergar mais como os latino-americanos que somos, uma América Latina Negra, Indígena e Multicolor (Foto: Gustavo Petro / Facebook)

Petro reafirmou o compromisso de, junto à população, escrever uma nova história para o país, para a América Latina e para o mundo.

Ao lado da nova vice-presidenta, Francia Márquez, e de partidários e familiares, ressaltou que é o momento de possibilitar um futuro de iguais oportunidades para todos e todas as colombianas, conclamou Petro.

Minutos antes, Francia Márquez havia lembrado que, após 214 anos, os colombianos conseguiram “um governo do povo, um governo popular, das pessoas de mãos calejadas, das pessoas comuns, dos ninguéns”.

Assista aos momentos finais da apuração e os discursos de Petro e Francia Márquez retransmitidos pela TV Diálogos do Sul:

Petro e Francia Márquez destacaram agradecimentos aos militantes, que ao longo dos últimos meses se dedicaram a conquistar votos e tornar possível o resultado deste domingo: “agora são vocês a força da mudança, do amor e da esperança”, acrescentou Petro.

Violência

“Quantas pessoas desaparecem nos caminhos da Colômbia? Quantos morreram? Quantos estão presos”, questionou Petro, mencionando o encarceramento de jovens da chamada “Primeira Linha” — grupo que se colocava diante das manifestações para impedir violência policial —  “tratados como bandidos somente porque tinham esperança”.

Nesse caminho, Petro pediu ainda que esses jovens líderes, considerados presos políticos, sejam libertos, além de que o mandato de Daniel Quintero Calle, ex-prefeito de Medellín, seja restituído. Em maio, Quintero foi afastado pela Procuradoria do país por um vídeo de seis segundos em apoio a Petro.

Adotando um tom pacifista, na contramão dos governantes de ultra-direita que detiveram o poder nos últimos anos, Gustavo Petro afirmou que, em seu governo, não haverá perseguição política: “a oposição que teremos será sempre bem-vinda ao Palácio de Nariño”, apontou.

Direcionando atenção à violência brutal que atinge sobretudo as áreas mais vulneráveis da Colômbia, Petro destacou a necessidade de “diálogos regionais que nos permita ver o conflito [armado ainda existente] em sua especificidade regional”, fazendo jus à diversidade de incluir mulheres, camponeses e indígenas.

O discurso de Petro foi marcado ainda pela presença da mãe de Dilan Cruz, jovem executado pelo Estado colombiano durante os protestos em 2019, e que é uma entre as várias vítimas da brutalidade estatal: “Em você está a nossa esperança, por justiça. A esperança dos necessitados. Bem-vindo à Colômbia e ao nosso país”, diz a mãe.

“A partir do nosso governo, em 7 de agosto, começará a paz”, disse Petro, em referência à data da posse do novo governo. Sobre a proposta de fazer com que as armas deixem de disparar, destacou: “não é matar-nos uns aos outros. É nos amar uns aos outros”.

Economia e Meio Ambiente

No tocante à Economia, o líder progressista refutou a ideia, disseminada pela oposição, de que seu governo tentaria expropriar os bens dos colombianos: “vamos desenvolver o capitalismo na Colômbia, não porque o adoremos, mas porque temos que superar o feudalismo na Colômbia, a nova escravidão”, observou Petro, cujo projeto visa dar espaço para que as comunidades indígenas desenvolvam sua cultura.

“Sairão formas desse capitalismo, tomara, não especulador, mas produtivo e novas formas para a humanidade, com uma economia forte”, que deve transitar, segundo o presidente eleito, de uma economia extrativista para uma produtiva, aliada à Justiça Ambiental.

O governante colombiano mostrou ainda o compromisso de acelerar os passos de transição a uma economia descarbonizada, uma vez que seu governo “pretende ser um governo da vida”:

“Temos que produzir de forma que não se afete a água, o pântano, que não se mate nada”, disse, lembrando o dever do país de “salvar a selva amazônica em nome de salvar a humanidade”, além de construir novas tecnologias e buscar um mundo de novo equilíbrio com a natureza.


* Texto publicado originalmente em Diálogos do Sul Global.